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Corpo-Gesto

TIPO DE PROJETO

Exposição

DATA

09 de Dezembro, 2023 - 18 de Fevereiro, 2024

LOCAL

NONADA, Zona Norte - Rio de Janeiro

ONG APOIADA

CASA NEM

ARTISTAS PARTICIPANTES

Adrianna eu, Agrade Camiz, Ana Clara Tito, Anna Bella Geiger, Ayla Tavares, Brígida Baltar, Carla Chaim, Darks Miranda, Iah Bahia, Iole de Freitas, Mestre Irinéia, Letícia Parente, Lia Chaia, Lyz Parayzo, Marcia Thompson, Nazareth Pacheco, Niura Bellavinha, Rose Afefé e Val Souza

FOTOGRAFIAS POR

GS Soluções de Imagens

CORPO-GESTO foi concebido a partir do debate sobre a intenção do corpo perante o gesto: um gesto emocional, um gesto intencional, um gesto reativo, uma marca de identidade ou até mesmo a prevenção do gesto. Foi do pensamento dessa pluralidade de resultados através do gesto que curadoria se estabeleceu, e que conta com uma diversidade de obras que abarcam tanto expressões corporais como resultados obtidos através dos movimentos do corpo.

Ao considerarmos a gesticulação como uma expressão ou tentativa do corpo humano de restabelecer a normalidade, propomos uma curadoria exclusiva de artistas mulheres ou não binárias para abordar esse tema. Os trabalhos apresentados traduzem suas vivências com e por meio de seus corpos, explorando as relações com os movimentos corporais.

As imagens dos corpos das artistas estão presentes em algumas das obras, destacando a proposta curatorial de maneira mais evidente. Por exemplo, Letícia Parente, através de seu filme desenvolvido a partir de imagens fotográficas, gesticula pés e mãos e pede por "ora pro nobis [ore por nós]", colocando o corpo como sagrado ou buscando intercessão divina para sua proteção. Darks Miranda, entretanto, realiza uma pose que nos remete a um gesto obsceno enquanto desfruta de um mamão, desafiando a objetificação das personagens "mulher-fruta " e encontrando prazer em si mesma.

Para a participação de Anna Bella Geiger, sugerimos um de seus trabalhos mais emblemáticos, no qual a artista critica uma identidade nacional simulada em cartões postais do Brasil. Ao repetir gestuais indígenas nesses cartões, Geiger expõe não apenas a exotização das imagens, mas ironicamente apresenta abismo entre a representação estereotipada e romantizada dessas imagens e a dura realidade da violência sofrida pelos povos originários por parte do Estado. Além dessa obra, duas outras fotografias suas estão presentes na mostra, nas quais vemos o delinear de uma escavação em formato de corpo na terra, parecendo uma cena ritualística. Podemos abordar a obra através de dois caminhos: imaginamos a presença da artista como sujeito desse processo ritual assim como a pessoa por trás das mãos que escavam as marcas.

Carla Chaim e Niura Bellavinha incorporam em seus trabalhos os rastros de presença das artistas. A marca do pincel de Bellavinha e da mão de Chaim na obra intitulada "Tapas" enfatizam os movimentos das artistas, revelando o corpo como o feitor de marcas: são gestos expressivos que demarcam a performatividade das artistas. A presença e gesto funcionam também como ação do tempo sobre o ato de pintar. As obras de Márcia Thompson enaltecem esse diálogo considerando ações opostas: a obra, o material não se contém. A tinta à óleo esbanja domínio, fazendo com que a própria artista perca o controle. A tinta que demora a secar, de repente enclausurada dentro de uma caixa de acrílico vai demorar ainda mais para enrijecer e com isso vai sujando as paredes outrora limpas da sua contenção. A falta de controle permite o gesto, a marca e o corpo da obra de desenvolverem livremente, crescendo para dentro do espaço de forma desmedida.

Lia Chaia apresenta duas fotos de telas de proteção com tramas cortadas à la Fontana, expondo mais nitidamente o que está por trás. O gesto de corte permite o ofuscamento dos planos, do primeiro plano (tela) ao pano de fundo (espaço, ou jardim), do que é obra de arte com o que é vida. Considerando a execução da obra em impressão fotográfica, os planos são um único, produzindo uma manipulação imagética que na verdade abre espaço para para a transposição de outros lugares, como as florestas e jardins por detrás dos controlados painéis.

Muitas obras escultóricas transferem a imagem dos gestos para a corporalidade material, conferindo realidade aos fragmentos e vestígios do corpo. As artistas Ayla Tavares e Mestre Irinéia investigam marcas de mãos e traços minuciosos. Tavares desenvolve candelabros de cabeça para baixo e de formas tortuosas, perturbando a lógica prática do objeto. Na montagem das esculturas percebemos os desenhos feitos pela artista nas superfícies que ficam escondidas como apoio das peças superiores, um gesto de cuidado e afeto com o que é interior, com a obra e com quem a maneja. Ambas artistas consagram o passado, a natureza e o natural. Irinéia, pisoteia, amassa e molda o barro de maneira bem artesanal, suas esculturas são lembranças de uma vivência local de sua comunidade, a árvore apresentada na mostra relembra uma enchente na qual ela e suas irmãs passaram a noite em cima de uma jaqueira esperando a água baixar.

A escultura de Iole de Freitas é composta por placas de policarbonato translúcido e uma grande lança em rosca que conectam as três placas avulsas. As formas de policarbonato ganham movimentos sob as mãos da artista, se contorcendo ou se movimentando de forma inusitada e até mesmo improvável. Como em um alongamento ou uma dança, notamos a tensão de cada pose que mantém equilíbrio, força e leveza. A escultura de Iah Bahia é feita com papel de modelagem de roupas, moldados através de si, fazendo com que o próprio papel - material leve que corre risco de amassar ou rasgar - encorpe.

Tanto Ana Clara Tito como Brígida Baltar exploram em suas obras o paradoxo entre refúgio e detenção. A escultura "Usos da raiva" de Tito é manufaturada a partir do corpo da artista, que, através da força corporal, molda vergalhões ao seu redor, podendo ser um objeto de proteção ou de aprisionamento, proporcionando uma reflexão sobre os limites e as defesas que permeiam a condição humana. Baltar remete a ideia de proteção, da construção de abrigo, ao usar tijolos para erguer uma parede em volta de si. A partir de uma série de registros de uma ação, observamos a artista estruturando uma torre circular que acaba a enclausurando em vez de a abrigar.

As marcas de ferrugem de grades metálicas com estilos rebuscados são impressas na tela de Agrade Camiz. Deixa-se acontecer, permitindo com que o tempo tome conta do transcurso e não apenas a intenção, a marca deixada pode ser uma analogia à cicatriz, como certifica o nome do trabalho, e também ao processo de abrir mão da nossa capacidade de aguentar, aceitando os vestígios como parte da vivência. A pintura de Rose Afefé também cruza paralelos com temporalidade. Carregada de nostalgia, nos suscita o desejo quase incontrolável de nos relacionarmos com ele, induzindo a imaginação do movimento manual de abrir ou fechar a tramela. O que é aberto ou fechado? O que é exposto ou coberto? São dúvidas que surgem mas que são respondidas a partir do afeto de cada um.

Já Lyz Parayzo, por meio de seu móbile, sugere um contra-gesto: um objeto lúdico que, na verdade, desencadeia lesões e cortes na pele, representando um contra-ataque a quem se arrisca a interagir com a obra. O trabalho resulta de gestos de corpos que se defendem e, por isso, atacam. Os trabalhos de Nazaré Pacheco, quase como premonição de um intervir com Parayzo, são causa e consequência: a imagem das gotas de sangue é o resultado de um pequeno manuseio impreciso das giletes e bisturis tão presentes na pesquisa e na vida da artista, fruto da execução de uma obra anti-toque.

Adrianna eu expõe uma singela obra: uma escova de prata que, no lugar de seus dentes, encontram-se fios de prata. Para além de um contra-gesto, a impossibilidade do gesto se apresenta no impedimento total de utilizar a escova de forma usual, que atrapalha e faria emaranhar os fios metálicos com os da cabeça. A obra, afinal, carrega o título "As inúteis".

Val Souza constrói um encontro com o espectador. Ao utilizar de espelhos, a obra só pode ser completa a partir do reflexo de quem a encara e do ambiente à sua volta. Porém, esse espelho é repartido e fragmentado em semicírculos que nunca se completam, dificultando as costumeiras práticas gestuais de acontecerem.

Gabriela Davies e Maíra Marques

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